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VIAJAR.

A descolagem, a ruptura com o dia-a-dia, começa no aeroporto. Mas é no avião que ganhamos asas imaginárias, que nos transportam até ao nosso regresso. E não fosse isso suficiente, enquanto passeamos nas nuvens, estamos completamente desligados, incontactáveis, essa sensação tão pouco habitual neste mundo non-stop. Aquele tempo é só nosso. Chegados ao nosso destino exótico, por muito semelhante que seja àquele de onde partimos, começa a divagação pela novidade. Ziguezagueamos pelas ruas, e a mais simples placa de sinalização, escrita numa língua diferente da nossa, já nos encanta pela diferença. Estamos mais atentos aos detalhes, olhamos mais para cima e para os lados, e para a ornamentação dos prédios, para as montras ou candeeiros de rua. As lições dos livros de História ganham vida, significado. Aliás, aprendemos História, compreendemos melhor o porquê da nossa sociedade como a conhecemos, de onde veio e porquê. Aprendemos com outras formas de estar, pensar, interagir, vestir, trabalhar, comer, passar o tempo. E pouco a pouco, tornamo-mos mais abertos, flexíveis, destronamos preconceitos, julgamos menos, ganhamos proximidade, mais sentido do mundo.

Arrebatamo-nos com a diferença e com o esplendor de outras paisagens, sejam obra do homem ou da natureza. Sentimo-nos pequeninos e grandes, privilegiados e humildes, perante tamanha beleza. Nem sempre a viagem é tão imersiva como gostaríamos. Nem sempre acontece, por esta razão ou por outra, convivermos com locais, absorvemos deles aquilo que nos aproxima e nos distingue. Por vezes a viagem fica-se pelo deambular pelas ruas. Não precisamos, é certo, de apanhar um avião para viver estas sensações. Elas podem ser vividas na nossa própria cidade ou país. Podemos bem passear pelas nossas ruas com as asas de faz de conta. Olhar para cada canto que conhecemos desde sempre, como se fosse a primeira vez. Perdermo-nos na nossa cidade. Eu precisei de viajar para e por outras geografias para aprender a olhar a minha cidade com olhos de ver. A dar-lhe valor. Saber sempre para onde quero voltar, ensinou-me a procurar a novidade no meu lugar de todos os dias, a quebrar a rotina no meu destino de sempre. Mas raros são os exercícios que me enchem a alma de igual modo como este, de entrar num avião e partir à descoberta do mundo, de o absorver e, passo a passo, torná-lo mais meu.

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